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domingo, 16 de novembro de 2014

Fotografia

Olho esse olhar alheio
Como se olhasse no espelho
Sou ampola vazia
O líquido se esvaiu
Partiu de avião
Deixou solo sob meus pés
Pesa sobre os ombros
A lembrança de ser filha.

Pão

A faca o varou de cima a baixo. Os dedos do algoz arrancaram um naco das entranhas e fizeram uma pequena bola. Atiraram-na à boca e os dentes estraçalharam a esfera fofa. Enfim, a faca prateada envolta em manteiga deslizou pelo pseudofrancês vencido. 28/09/2013

Portão

Eram duas meninas de uns 6 anos de idade, gêmeas nas roupas, nos cabelos presos em uma chiquinha só, na pele negra e na síndrome. Mãos entrelaçadas ao gradeado de um lava-rápido. Olhos oblíquos, espertos, observando a treva. De repente, uma besta saltou no portão aos urros. As pequenas esticaram as mãozinhas para acariciar a fera. A mãe surgiu e socorreu quem não queria ser salvo. Contrariadas, seguiram a mãe, acenando para o novo amigo. 31/08/2013

Passageiro

Passei a mão em uma de suas nádegas e segurei na barra de metal. Ele cravou o cotovelo em um de meus seios. Eu o encoxei subindo um degrau. A bolsa protegia minha genitália. O motorista fechou a porta e o ônibus pôde seguir viagem. 24/08/2013

Recolhimento

Ele dorme atravessado na cama, boca aberta assobiando um ronco. Calça jeans, moletom e meias. Ela desata o cinto dele e puxa o jeans. Ele se mexe e levanta um pouco o quadril para a peça deslizar. Depois é a vez de o moletom ser retirado. Ela empurra o corpo quente dele para caber ao seu lado na cama. Ele joga as pernas sobre o corpo ainda frio dela. Ela recosta a cabeça no peito dele e tem os cabelos finos acariciados. Ela embrenha os dedos nos chumaços do cabelo dele. Até que os movimentos cessam e tudo silencia, exceto o Pink Floyd no rádio relógio. 17/08/2013

Resignação

Escova os dentes, perscruta espinhas. Janelas fecham-se violentamente. A porta não se abre. De soslaio vê o boxe vazio. Os olhos voltam-se para o outro lado e param na cama king size. Retornam ao espelho e contemplam-se por mais alguns instantes. Cronos espreita. A mão abre e fecha sufocando o ímpeto de esmurrar o espelho. 17/08/2013

Livro

No banco da praça singro canais gondoleiro
No espelho lido com o livro lido
Desembaracei o novelo e agora só bagaço

 14/06/2013